Procurando alguma coisa?

Contos

Xaveco

É fim de tarde na cidade de João Pessoa, caminho pela Praia do Cabo Branco, um jovem está sentado na areia, o seu rosto irradia uma alegria contagiante, difícil de descrever através de palavras. Quando passo por ele recebo um sorriso e os votos de um final de dia maravilhoso para mim e para minha família, retribuo o sorriso e os votos de felicidade. Continuo a caminhada na direção da Ponta do Seixas, mais adiante encontro algumas pessoas, mas nenhuma irradia tanta alegria quanto o jovem. Depois de caminhar algum tempo na areia subo para o calçadão e sento em um banco, a imagem do jovem aparece novamente na minha mente, o seu sorriso alegre como o de uma criança ao receber um brinquedo. Fico algum tempo descansando, depois tomo o caminho de volta, agora pelo calçadão. A tarde está suave como costuma ser no inverno em João Pessoa, caminho distraído sem prestar atenção a nada, divago pelo mundo da fantasia quando uma pessoa toca no meu ombro. Olho para o lado que foi tocado e ali está o jovem do sorriso encantador.

– Desculpe a minha intromissão, meu nome é Albertino, gosto muito de conversar e quando você passou por mim senti vontade de pedir para se sentar um pouco e conversarmos. Faltou coragem, tive que vencer a minha timidez para lhe dirigir a palavra.

– Muito prazer, Marcos. Também senti vontade de conversar com você, mas não quis interromper o pensamento que provocava a alegria espelhada no seu rosto naquele momento. Podia ser um momento mágico em sua vida, não devia ser interrompido.

– Podemos conversar um pouco?

– Claro, respondo ao mesmo tempo em que seguro o seu braço com uma mão e com a outra indico o banco da calçada onde nos sentamos.

– Moro há pouco tempo nesta cidade, eu nasci e morei no interior até poucos meses atrás, coloca Albertino. Fiz um concurso público e passei, há poucos meses assumi um cargo nesta cidade, desde que me mudei sinto falta da vida simples do interior.

– Você é o primeiro jovem que conheço com tal desejo. Geralmente os jovens querem morar em cidades maiores, preferem os grandes centros urbanos como o Rio de Janeiro e São Paulo.

– Há alguns dias atrás eu estava aqui na praia conversando com um amigo dos meus pais quando você passou perto de nós. Ele disse que o conhecia e que você escreve poesias.

– Costumo escrever para ocupar o tempo disponibilizado pela aposentadoria.

– Gostaria de lhe pedir um favor, coloca Albertino, silenciando em seguida.

– Sinta-se à vontade para colocar o que deseja. Da minha parte eu não terei constrangimento para dizer se vou atender ou rejeitar seu pedido.

– Gostaria de escrever uma poesia para minha namorada… Você faria isso para mim e eu diria que fiz para ela?

– Não, não e não. Esta seria a maior mentira que você poderia dizer para a sua namorada. Na poesia estariam os meus sentimentos, a minha maneira de ser e de olhar a Vida. Um relacionamento construído sobre o alicerce da mentira tem vida curta ou não se aprofunda. Os seus sentimentos podem ser mais belos do que os de um poeta, mostre os seus sentimentos para ela da maneira que você sabe fazer. Um gesto ou um olhar podem dizer mais coisas do que uma poesia.

– A mulher gosta de escutar coisas bonitas…

– Você está completamente equivocado, a mulher gosta de escutar declarações de amor, não importa a forma como são ditas, para a mulher o importante é ouvir o ser amado dizer que a ama. Para sua namorada terá mais valor uma palavra sua, vinda do coração, do que uma poesia de Camões dizendo a mesma coisa.

– Não seja rígido, abra uma exceção e faça a poesia para minha namorada.

– Meu caro Albertino, gostaria de dizer que foi um prazer ter conhecido você, mas eu não gosto de mentir. Passe bem!

Deixei o Albertino falando sozinho e segui minha caminhada, confesso que não foi uma atitude elegante, mas algumas pessoas têm o dom de esgotar rapidamente a minha paciência. Um relacionamento construído sobre bases falsas não resiste às desavenças normais que acontecem na vida de duas pessoas. Agora eu me pergunto se o sorriso dele quando me viu era apenas o vislumbre da possibilidade de obter uma poesia para enganar sua namorada. Caso eu tivesse escrito a poesia eu não sei quem seria mais enganado, a namorada dele que receberia uma declaração de amor de outro homem ou ele que estaria dando para a namorada um verso sofrível pensando que tinha qualidade.

Marcos Antônio da Cunha Fernandes
João Pessoa, 26 de junho de 2009.
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