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Contos

Contos da Carochinha

Na época da minha infância eu escutei muitas historias sobre a necessidade de me alimentar bem, comer verduras e frutas para manter a saúde. Até aí tudo bem, estava recebendo uma informação correta, mas algumas pessoas que conviviam comigo diziam que eu deveria comer para ficar bonito, uma informação incorreta. A beleza de uma pessoa não se modifica com o seu peso, existem gordinhos e magrinhos bonitos. Eu fiz um esforço tremendo para me alimentar bem, esperava ficar bonito, mas depois de algum tempo verifiquei que não tinha conquistado a beleza prometida, apenas tinha aumentado o peso. Depois de constatar este fato eu deixei de acreditar naquelas pessoas e aprendi que alguns adultos enganam as crianças com informações erradas para atingir o objetivo imediato deles, sem examinar os danos que tal atitude pode causar às crianças. Como existiam pessoas adultas que falavam a verdade para mim, isto manteve a minha fé no ser humano e me ensinou a distinguir os vários tipos de pessoas, mas também me ensinou a mentir, a enganar as outras pessoas.

No meu tempo de criança, quando eu perguntava como os bebês nasciam, recebia a célebre explicação de que eram trazidos pelas cegonhas. Caso eu não ficasse muito convencido com a explicação, recebia a informação adicional de que não deveria me preocupar com tais assuntos, as crianças deveriam se ocupar em brincar, com esta colocação a conversa era encerrada. Quando a barriga da mãe começava a crescer as crianças da minha época queriam saber a causa, mas os adultos não falavam sobre o ato natural da procriação, davam algumas explicações capazes de envergonhar qualquer criança dos dias de hoje. Os livros escolares utilizados pelos meus filhos reproduziam o ato sexual entre um homem e uma mulher, mostrando de maneira clara e objetiva como as crianças são geradas. Na minha época poucos pais davam educação sexual aos seus filhos, deixavam que eles descobrissem por si mesmos, às vezes de maneira inadequada e com conseqüências boas ou ruins para o resto de suas vidas. E nas escolas o sexo era matéria proibida.

Quando nos apaixonamos pela primeira vez fazemos promessas de amor eterno. Com o passar do tempo descobrimos que aquele amor se acaba, aquele sentimento tão lindo, julgado imortal, falece com a passagem do tempo, sem que nós tivéssemos percebido o momento da sua morte. Algumas vezes a morte do primeiro amor é brusca, causa muito sofrimento. Ficam sempre as recordações doces e amargas dos momentos vividos no primeiro amor. Outros amores passam em nossas vidas, mas as lembranças daquele primeiro amor deixam marcas que o tempo não consegue apagar da memória. Quando eu era garoto as pessoas mais experientes me ensinaram que os amores passam e nem as lembranças ficam. Eu aprendi que as pessoas passam, mas as lembranças ficam a bailar no coração, apesar do nosso sentimento pertencer agora a outra pessoa.

No meu tempo de rapaz as idéias sobre o relacionamento sexual de um casal eram muito distorcidas, os livros e os meios de comunicação informavam muito pouco sobre a sexualidade do homem e da mulher. Os mais velhos, nas poucas vezes que falavam sobre o assunto, nos diziam que devíamos respeitar nossas esposas, quando um homem desejasse fazer algo diferente no campo do relacionamento sexual, deveria procurar uma prostituta. Este conselho era dado com solenidade e o adulto assumia aquele ar de superioridade, aquela cara de quem faz um favor a uma criança que deveria se preocupar apenas em brincar. Estava justificada e institucionalizada a traição masculina. Com o passar do tempo nós observamos que algumas mulheres procuravam fora do casamento a satisfação sexual que o seu companheiro não lhes dava. É verdade que existiam mulheres que se mantinham fiéis aos seus maridos, apesar da insatisfação sexual, mas eram pessoas pouco felizes e colocavam em outros processos criativos as energias sexuais das suas almas. Ainda hoje nós observamos alguns homens nordestinos com este tipo de comportamento, eles acham que suas mulheres não gostariam de ser suas amantes. Um pequeno detalhe: eles nunca perguntaram às suas esposas como elas gostariam de ser amadas na cama.

Uma das maiores decepções que os jovens têm nos dias de hoje é o seu ingresso na universidade. Eles esperam encontrar nas salas de aula mestres capazes de lhes fornecerem as chaves para abrir as portas do conhecimento. Mas no lugar de professores encontram grevistas preocupados apenas com os seus salários, sem vínculos afetivos com a educação dos jovens. Existem professores que são verdadeiros missionários da educação e conseguem dar aos jovens as chaves para desvendarem as disciplinas que ensinam, mas são poucos. Os professores das escolas públicas e das universidades não têm um salário digno, é necessário mudar esta realidade, mas também necessitamos fazer de nossas universidades fontes de conhecimento. Caso não tenhamos sucesso em tal empreendimento, corremos o risco das gerações futuras acharem que buscar conhecimentos nas universidades é um conto da carochinha.

Os maiores contos da carochinha que os brasileiros escutam deveriam ser reunidos sob um único título: Promessas dos Políticos. Caso alguém tente editar um livro sobre este assunto, o material é tão extenso que torna inviável a sua publicação, mesmo quando se usa alguns filtros para reduzir o tamanho da amostra. Não há como negar, no campo das promessas os políticos brasileiros são campeões. Eles fazem todo tipo de promessa, sem o menor constrangimento e com a maior cara de pau, pois sabem que não iremos cobrar o cumprimento delas quando eles forem eleitos. Deste modo chegamos à conclusão de que nós somos os verdadeiros contos da carochinha.

Marcos Antônio da Cunha Fernandes
João Pessoa, fevereiro de 2008.
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