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Contos

Walkover

Quando em uma competição um dos participantes desiste, é dada a vitória ao outro, o que é denominado de “walkover”. Na vida cotidiana, quando as pessoas desistem de lutar suas batalhas, dizemos que jogam a toalha, abandona a luta. Algumas pessoas desistem de uma boa luta no meio da batalha, por discordarem das atitudes das pessoas envolvidas naquele confronto. Encontramos pessoas que desistem de votar alegando que a maioria dos políticos deveria estar presa por assalto aos cofres públicos, estas pessoas esquecem que com esta atitude elas dão aos desonestos as condições necessárias para eles atuarem sem sofrerem conseqüências. Elas concordam que precisam expressar com urgência as suas indignações, mas não entendem que deixar de votar é abandonar o campo de batalha para os corruptos e não deve sequer ser cogitado como opção. Escutamos pessoas expressarem a sua indignação contra a desonestidade que assola o Brasil de norte a sul, de leste a oeste, mas não transformam tal indignação em ação concreta contra os desonestos. Assistimos nos dias atuais uma luta gigantesca contra a desonestidade. No exato momento em que a luta se acirra, na hora em que alguns desonestos são presos, o ruído da luta assusta algumas pessoas, elas se retiram do campo de batalha e enfraquecem o exército dos honestos. Juntamos conversas esparsas que escutamos por aí em um diálogo entre dois personagens imaginários.

– Todos os dias a imprensa noticia um escândalo envolvendo políticos no desvio de dinheiro público, eu não agüento mais tomar conhecimento de tanta corrupção, coloca Xavier.

– Para mim isto mostra a existência de pessoas honestas que lutam contra a corrupção e tentam colocar os ladrões na cadeia, responde Neuza.

– Isto é apenas uma cortina de fumaça para enganar o povo, dentro de pouco tempo estarão todos soltos, gastando o dinheiro roubado dos cofres públicos.

– Existe uma legislação que deve ser obedecida, eu não gosto de ver estes ladrões soltos, mas se a lei permite que eles fiquem em liberdade até que sejam julgados, devemos respeitar a lei. Caso a legislação não seja adequada, o que devemos fazer é modificá-la, mas devemos cumprir a lei em vigor, esta é a essência do estado de direito.

– Minha amiga, você é uma sonhadora, para ladrão só existe uma maneira de lidar com eles: cadeia!

– Você hoje está amargo…

– Estou decepcionado com a classe política, interrompe Xavier. Tomei uma resolução: não voto mais!

– Esta é uma decisão equivocada, no justo momento em que o Brasil mais precisa do seu voto para nos transformar em uma Pátria onde predomine a justiça, o trabalho e a honestidade. Você não me parece uma pessoa capaz de desistir de uma jornada no meio do caminho.

– Estou cansado de ver tanta desonestidade sem nenhuma conseqüência para os que malversam a coisa pública.

– Então redobre os esforços contra os desonestos, participe de organizações que se dedicam ao combate da corrupção. Aja! Imagine o Brasil que você deseja deixar para os seus filhos e lute para construí-lo.

– Estou descrente de tudo e de todos, vou ficar em casa vendo televisão.

– Vai se trancar em casa e apodrecer diante de uma televisão enquanto existem tantas coisas a serem feitas aqui fora, pergunta Neuza.

– Muita gente faz isso, por que eu também não posso ficar em casa?

– Porque você é um cidadão que tem consciência política, um ser que deseja legar para os seus filhos um futuro melhor, somente por isto!

– Eu pensei que os arroubos juvenis tinham ficado no passado, no tempo em que éramos estudantes, mas vejo que estou enganado, você continua olhando a vida da mesma maneira. Na nossa idade devemos ter uma visão mais madura da vida.

– Meu querido amigo, coloca calmamente Neuza, hoje eu me considero uma mulher madura em todos os aspectos que você possa imaginar. Mas a maturidade não mata o entusiasmo nem a vontade de realizar, de trabalhar pela construção de um futuro melhor para nossos filhos e netos. Aquelas idéias de mulheres de idade sentadas em uma cadeira de balanço, fazendo crochê, são coisas do passado. Maturidade não significa perda do entusiasmo de viver, mas maior capacidade de avaliar uma determinada situação e de criar as condições necessárias para concretizar os nossos sonhos. Quando o ser humano tem o entusiasmo da juventude e a capacidade de avaliação da maturidade, ele se torna capaz de realizar grandes coisas, ele é capaz de mudar a si mesmo e de contribuir para melhorar o ambiente em que vive. Eu conheço você muito bem e sei que possui estas duas coisas e pode realizar muitas tarefas que beneficiarão inúmeras pessoas. Por que quer abandonar uma luta que apenas começou? Por acaso você deseja que os desonestos tomem conta do Brasil?

– De que adianta a minha voz a gritar? Ninguém me escutará e ainda correrei o risco de ser considerado louco.

– Funde uma ONG ou junte-se a uma já existente e comece a desenvolver as inúmeras idéias que povoam a sua cabeça.

– Para você as coisas são simples e fáceis, mas a realidade é bem diferente, existem dificuldades a serem vencidas.

– As dificuldades somente são vencidas quando começamos a trabalhar, elas não são arredadas do nosso caminho com palavras, mas com ações concretas. Em conversas anteriores você me disse que o brasileiro não sabe votar, que é enganado por políticos desonestos, então comece a trabalhar no desenvolvimento da consciência política destas pessoas. Já existem muitas organizações trabalhando neste sentido, junte-se a eles e aja, ajude a construir o futuro que você sonha. Não deixe que o desânimo e a descrença tomem conta do seu espírito, com a nossa ação no dia de hoje construiremos um Brasil melhor para as gerações futuras.

Os dois amigos ainda trocam idéias durante um longo tempo. Xavier foi se entusiasmando com a possibilidade de se engajar em uma ONG e recebe de Neuza os nomes e os telefones de três amigos dela que já trabalham em organizações que fazem o trabalho almejado por ele. O entusiasmo de Neuza contagia Xavier que se despede dela acreditando que pode melhorar a realidade brasileira com o seu trabalho.

Marcos Antônio da Cunha Fernandes
www.marcosfernandes.org
João Pessoa, 8 de julho de 2008.
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