― Bom dia Antônia.
― Bom dia dona Sílvia. Posso servir o seu café agora?
― Pode sim, ponha bastante comida na mesa, estou com muita fome. Esta caminhada diária na praia e o banho de mar me fazem muito bem, eu gastei muita energia nestas atividades, necessito comer para repor o que gastei.
― Depois que a senhora tomar seu café eu gostaria de perguntar uma coisa.
― Está bem Antônia, quando terminar a refeição nós conversaremos, mas agora necessito comer.
Sílvia faz seu desjejum com calma, saboreia cada alimento. Antônia já trabalha na casa dela há bastante tempo, conhece seus costumes, estabeleceu com a patroa uma relação de respeito mútuo, sabe que ela não gosta de conversar enquanto come. Sílvia é para Antônia a fonte fecunda de informações para explicar as coisas que ela não entende.
― Terminei Antônia, estou à sua disposição.
― Hoje eu escutei, lá na padaria, um homem dizer que uma pessoa morre quando deixa de ver a beleza do mundo. Achei estranho isso, os cegos não vêem nada e estão vivos. Não entendi bem o que ele quis dizer com isso, peço para a senhora me explicar bem direitinho o significado desta frase. Depois anotarei todas as explicações no meu caderno, quando este assunto for estudado na escola eu quero arrasar!
― Esta pessoa utilizou o que na língua portuguesa se chama de metáfora.
― Espere um pouco, por favor, o professor mandou usar o dicionário quando eu não entendesse o significado de uma palavra e eu não sei o que é metáfora. Após olhar o significado da palavra no dicionário recomendado pela sua escola, Antônia fala: a explicação é mais complicada do que a palavra, fiquei sem entender o que é metáfora.
― Vou tentar lhe explicar o que é metáfora. Quando uma pessoa diz: “a mulher é uma fera quando ela defende os filhos”, isto é uma metáfora, pois a palavra fera está sendo empregada em sentido diferente daquele que aparece no dicionário, esta pessoa quer dizer que a mulher lutará bravamente para defender os filhos. Quando alguém diz: “dê asas à sua imaginação”, também emprega uma metáfora, pois a imaginação não tem asas, ela pede para deixar a imaginação livre para criar sem limitações. Entendeu?
― Eu vou dizer uma coisa dona Sílvia, quando a senhora explica o significado de uma palavra é outra coisa, eu entendo facilmente.
― Esta explicação que lhe dei está em um dos dicionários que eu uso. Nesta Natal vou lhe dar dois dicionários de presente, desta maneira você não terá mais este tipo de problema. Os dicionários, assim como todas as criações dos seres humanos, refletem o modo como seus autores vêem o mundo. Alguns dicionários explicam as palavras mais simples de modo obscuro e complicado, outros explicam de modo simples e compreensível as palavras mais complicadas.
― As minhas colegas não acreditam quando eu digo que a senhora me ajuda a entender muitas coisas e tira as minhas dúvidas das lições da escola. E quando eu digo que a senhora vai me ajudar a conseguir um emprego melhor quando eu terminar o curso, elas me chamam de iludida.
― Todos nós agimos de modo egoísta, pensamos apenas nos nossos interesses. Eu também sou egoísta, mas busco modificar meu comportamento, procuro pensar também nos interesses das pessoas que convivem comigo. Quando você concluir seus estudos eu lhe ajudarei a conseguir um emprego na empresa de um dos meus amigos. Quando você sair eu sentirei a sua falta, farei as tarefas que você faz hoje, caso não consiga outra pessoa para me ajudar. Todo ser humano deve ajudar as pessoas que cruzam seu caminho, vou ajudá-la a realizar vôos mais altos.
― A senhora me ajuda a estudar e ter outra visão da vida. Quando eu sair da sua casa, conseguirei outra pessoa para fazer as tarefas que faço hoje.
― Obrigado Antônia. O comportamento das suas colegas de colégio é fruto das suas histórias de vida. Nós vemos o mundo de acordo com as nossas experiências de vida, mas esta visão também é influenciada por outros fatores, tais como nossas expectativas quanto ao futuro, nossa vontade de vencer e inúmeros outros fatores. Diga-me uma coisa: como é o aproveitamento destas suas amigas nas diversas matérias estudadas por vocês?
― Elas tiram notas baixas, não conseguem aprender algumas matérias.
― Quais as causas do baixo rendimento escolar delas?
― Elas não recebem ajuda para entender as lições.
― Será que é esta a causa? Alguma vez elas pediram para você ou outro aluno explicar as lições que não entendem?
― Agora que a senhora falou eu despertei para o fato de que elas não fazem perguntas aos professores, não pedem ajuda aos colegas e nada fazem para entender as lições estudadas na escola.
― Em todas as classes sociais encontramos este tipo de comportamento, as pessoas acomodam-se e nada fazem para mudar as suas vidas. Elas não se preparam para aumentar seu nível de conhecimento, que é uma das maneiras de melhorar suas vidas, depois amargam empregos de baixa remuneração ou o desemprego. Caso elas parassem para refletir, veriam que são responsáveis pelas situações que vivem a lamentar. Existem pessoas que fazem um esforço tremendo para melhorarem suas situações, mas nada dá certo para elas. Isto é outra situação que não temos tempo para discutir agora. Vou me aprontar para ir trabalhar, hoje irei almoçar e jantar fora, confraternizações de final de ano…
― Obrigado dona Silvia, a senhora é um anjo que Deus colocou no meu caminho para me ajudar.
― Não sou anjo, apenas um ser humano que busca se melhorar, apesar dos meus inúmeros tropeços. Quando eu regressar você estará na aula. Até amanhã.
― Até amanhã dona Silvia.
Marcos Antônio da Cunha Fernandes
www.marcosfernandes.org
João Pessoa, Dezembro de 2011.
