Estamos – alguns de nós – sonhando com implantação de “democracia direta pura” aqui no Brasil? E ainda citamos como exemplo o cantão de Glarus, na Suíça, que pelo censo de 2010 contava menos de trinta e oito mil habitantes (37.737, espalhados por 25 comunas, que se fundiriam em somente 3, no ano seguinte). Convenhamos: dava para reunir todo mundo de cada comuna numa praça, de quatro a seis vezes ao ano, e votar o que a população queria que fosse feito pela administração local.
Vamos acordar minha gente! A Suíça tinha, em 2012, segundo o Office Fédéral de la Statistique, uma população permanente de 8.039.060 (oito milhões, trinta e nove mil, e sessenta) habitantes; com um número expressivo de estrangeiros, 1.869.969 indivíduos (23% do total) aos quais não é dado o direito de votar. Para este mesmo ano, a estimativa do IBGE para somente o Estado do Ceará era de 8.606.005 habitantes residentes.
Ou estamos falando da democracia de Atenas, na Grécia antiga? Antes ou depois de Clístenes? Antes dele somente tinham direito a voto os descendentes das grandes famílias, nobres, ricas e tradicionais; e a partir do seu governo, quando os atenienses foram divididos em dez tribos (hoje seriam partidos), às quais tinham que se filiar para escolher seus representantes políticos –, é que aumentou a participação dos menos abastados (alguns plebeus) no processo. Mas nada de igualdade de direitos: somente homens livres, maiores de dezoito anos, nascidos de pai e mãe atenienses eram considerados cidadãos; o que representava algo em torno de um décimo da população. Mulheres, estrangeiros e escravos, os outros 90% da população, não votavam. Portanto, os conceitos de “povo” e “democracia” eram bem diferentes dos atuais, que consagram a soberania popular, divisão de poderes do Estado e declaração de direitos e garantias individuais.
Além do mais, se prestarmos atenção ao Art. 1º, Parágrafo Único da Constituição de 1988, veremos que vivemos em uma democracia semidireta (não inventei, o conceito existe, é um misto de representatividade com participação direta). O exercício direto está regulamentado no Art. 14 que trata de plebiscito, referendo, iniciativa popular.
Está na hora de reconhecer a nossa falta de vontade de participar mais ativamente da vida política do País: quantos de nós se abalam de sua vidinha para assinar petições pedindo o fim do voto secreto nas deliberações do Congresso, ou participou da iniciativa popular que resultou na adoção da “Ficha Limpa”?
Fortaleza, 03 de outubro de 2013.