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Crônicas

Noite de Chuva

Noite sem luar, as estrelas brilham no manto negro do céu, salpicando-o de pontinhos luminosos. O tempo começa a mudar, as estrelas vão sendo encobertas pelas nuvens, elas tapam a visão do céu, deixam apenas perceber as luzes artificiais da cidade. Uma chuva começa a cair de maneira persistente, tornando as ruas da cidade quase desertas. Um carro a passar de vez em quando, fazendo o barulho característico dos pneus a deslizarem no asfalto molhado, quebra a monotonia do som da chuva a cair na cidade.

Na noite chuvosa, pela rua deserta, em frente a minha janela caminha um ser humano. Ele parece carregar o peso do universo na cabeça e nos ombros. Sem estar agasalhado para enfrentar a intempérie, fisionomia carrancuda, triste, ensimesmado, alheio ao mau tempo, caminha pela calçada como se nada enxergasse, passa por cima das poças de água que se acumulam no seu percurso, parece vergastado por uma grande dor. Que drama perturba a sua alma para caminhar daquela maneira na noite chuvosa? Ele passa, segue adiante, a rua fica novamente deserta.

Logo a seguir vem outro ser humano a caminhar pelo mesmo local. Não parece alegre, tampouco está triste, apenas caminha na calçada molhada, desviando-se das poças de água ali acumuladas. Ele está bem agasalhado, protegido da chuva, caminha sem se incomodar com a água que cai do céu. Ele passa, segue adiante, a rua fica novamente deserta.

Passado algum tempo escuto um alarido, volto a observar a rua. Outro ser humano passa pelo mesmo trecho da estrada. Caminha sem camisa e sem sapatos, corre pela chuva, chuta as poças de água, canta e ri cheio de alegria, como uma criança a brincar na chuva. Levanta em silêncio a cabeça para o céu, a sentir a chuva a cair no seu rosto, como se estivesse a fazer uma prece muda ao Criador, agradecendo pela benção da chuva. Ele passa, segue adiante, a rua fica novamente deserta.

O silêncio volta a reinar, eu fico a meditar sobre as pessoas que passaram na rua. Eu permaneci à distância, apenas olhando o caminhar delas pela rua, em uma noitede chuva. Vi três comportamentos tão diferentes, no mesmo trecho da rua, diante da minha janela. Eu estou em casa, apenas olhando a rua, vendo as pessoas passarem, estou seco e abrigado. Não sei como é ficar na rua, em uma noite escura e chuvosa, massacrado pela tristeza, indiferente ou alegre, como aqueles três seres humanos que caminhavam na chuva.

Não caminhei com aquelas pessoas, não sei o que elas realmente estavam sentindo, não sei como eu me sentiria caminhando na chuva, em uma noite escura. Apenas fiquei abrigado, olhando a vida através da janela.

Marcos Antônio da Cunha Fernandes
www.marcosfernandes.org
João Pessoa, abril-junho de 2006.
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