Quando eu era jovem ficava fascinado com a história dos avanços da ciência, a luta dos cientistas contra os conceitos e os preconceitos da época. Os fatos apontavam para uma conclusão, mas a religião dizia outra coisa, então a maioria das pessoas negava o que via e se apegava às suas crenças. Os cientistas sustentavam a tese de que a Terra era redonda e apresentavam a evidência da chegada de um navio ao porto. Primeiro se enxergava os mastros, depois o convés e por último o casco do navio. Caso a Terra fosse plana, nós veríamos um pequeno ponto no horizonte, a aumentar de volume à medida que o navio se aproximasse do observador.
Quando eu analiso o modo como os conceitos e os preconceitos de uma época determinam o modo como o ser humano vê o mundo, eu pergunto a mim mesmo: qual é a distância existente entre a realidade e o modo como eu vejo o mundo? Quantas coisas são distorcidas pelas minhas crenças? Caso fosse possível retirar dos olhos as lentes dos meus conceitos e preconceitos, como eu veria o mundo? Este tema tem dominado os meus pensamentos nos últimos dias, sem que encontre uma resposta satisfatória.
A velocidade das mudanças está em processo de aceleração, eu fico a imaginar como será diferente o dia a dia do ser humano daqui a dez anos. Há algumas décadas atrás, quando se falava sobre a possibilidade da realização de operação plástica, as pessoas faziam piadas sobre uma mulher que chegava a um hospital e pedia um rosto, dois seios e uma bunda, como se estivesse fazendo compras em um supermercado. Nos dias de hoje isto é uma realidade banal, existem milhares de médicos especializados em cirurgia plástica. Ser bonito nos dias de hoje deixou de ser uma questão de herança genética para se transformar em uma questão financeira.
Eu fico pensando como será o mundo quando for possível realizar “operações plásticas morais”. Seres humanos horrendos do ponto de vista moral, destes que vivem envolvidos em assaltos aos cofres públicos, após “cirurgias plásticas morais” são transformados na mais alta expressão da conduta moral. Traficantes de drogas e assaltantes são convertidos em monges beneditinos. Prostitutas são transformadas em beatas. Comerciantes e industriais desonestos em pessoasaltruístas. Servidores públicos preguiçosos em trabalhadores incansáveis. Professores em educadores. Viciados em bebidas alcoólicas em abstêmios. Pregadores das várias religiões, depois de mais de uma operação por serem um problema mais sério, passam a viver de acordo com os ensinamentos que divulgam.
João Pessoa, agosto de 2007.
