Procurando alguma coisa?

Contos

Zé e Maria II

É final de uma tarde cinzenta de inverno, ameaça de chuva nas nuvens que cobrem o firmamento, a praia está quase deserta, poucas pessoas a passear no calçadão. Zé está sentado em um banco, contempla o vai e vem incessante das ondas e alguns pássaros que buscam se abrigarem nas árvores para passar a noite. A pouco e pouco o vento carrega as nuvens mais ameaçadoras para longe, mas o firmamento continua cinzento, uma brisa suave e fria mantém a maioria das pessoas recolhidas em seus lares. É uma situação bem diferente daquelas observadas no verão, quando as pessoas buscam a brisa da praia para aliviar o calor. Zé percebe alguém sentar ao seu lado, vira a cabeça para ver se era alguém que conhecia e se depara com Maria, uma pessoa que ele conversara rapidamente naquele mesmo banco da praia, há alguns meses atrás.

– Boa tarde, diz Zé.

– Boa tarde, responde Maria.

– Há muito tempo não lhe via aqui na praia, meu refúgio preferido para dar algum alento à alma, coloca Zé.

– Não tenho saído de casa, hoje resolvi seguir as recomendações médicas e caminhar durante vinte minutos. Terminei a caminhada e retornava para casa quando lhe vi, senti vontade de falar com você, espero não ter atrapalhado suas reflexões.

– Estava apenas contemplando a beleza desta tarde fria de inverno. Você está com algum problema de saúde?

– Não, são recomendações médicas para manter a saúde.

– Eu tenho caminhado pouco e também preciso fazer uma caminhada diária, segundo o meu médico. Não gosto de caminhar na esteira, venho andar na praia, depois me sento aqui e contemplo a natureza. O que você tem feito de novo?

– A mesma rotina de sempre, os mesmos sonhos de viajar e conhecer o mundo, a mesma falta de perspectiva de realizar meus sonhos.

– Esta falta de perspectiva é o reflexo do seu modo de pensar e agir.

– Não entendi sua afirmação a meu respeito.

– Quando eu começo a dizer que não consigo fazer uma determinada coisa, todo o meu ser age no sentido de concretizar este pensamento. Quando eu acredito que sou capaz de fazer uma determinada coisa, todo o meu ser se mobiliza para torná-la uma realidade.

– Entendi. Você está dizendo que eu sou a culpada por não conseguir concretizar os meus sonhos, coloca Maria.

– O que você faz para ganhar a vida?

– Sou funcionária pública estadual.

– Desenvolve alguma outra atividade profissional?

– Não, tenho apenas o meu trabalho no Governo Estadual. Espere aí, aonde você quer chegar com este inquérito?

– Já lhe direi, antes responda as duas últimas perguntas: tem as noites livres para fazer o que quiser? Qual o seu grau de escolaridade?

– Terminei o curso superior faz três anos e disponho de tempo quando termino as minhas atividades profissionais.

– Você tem inúmeras possibilidades de mudar a sua vida. Pode estudar para fazer algum concurso que lhe traga uma remuneração melhor. Pode fazer um curso de mestrado e doutorado, o que irá lhe colocar em condições competitivas no mercado de trabalho e abrirá as portas do magistério, caso você goste de ensinar.

– Você tem razão, eu ando um pouco acomodada…

– Um pouco? Não fique zangada comigo pelo que vou lhe dizer, mas para mim o seu nome é Maria Acomodada da Silva.

– Você é muito cara de pau! Mal nos conhecemos e já vai me rotulando de acomodada.

Marcos Antônio da Cunha Fernandes
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