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Crônicas

A Religiosa

Da última vez que estive com uma das minhas amigas ela tinha uma “novidade” para me contar, encontrou finalmente o amor da sua vida e casou novamente. Vale a pena salientar que esta é a décima sexta ou décima sétima vez que ela passa a viver com alguém, sem contar os namoros rápidos que duram apenas alguns dias. A sua vida daria um romance muito doido e picante, com alguns lances hilariantes, além de episódios dignos de um filme de terror, pois alguns dos seus relacionamentos por pouco não terminam em tragédia. É interessante ver como ela repete sempre a mesma história nos seus namoros, isto é, o relacionamento que está vivenciando é o amor tão esperado.

Ela agora é religiosa, vai para o culto semanalmente, abomina o álcool que classifica como obra do diabo, assim como qualquer vício, de acordo com a religião do seu namorado atual. Eu então me lembrei de um dos namorados dela que vivia embriagado e ela o acompanhava nas bebedeiras malucas, dirigindo embriagada por ruas movimentadas, pondo a vida dela e a das outras pessoas em perigo. Acho que ela já abraçou todas as religiões existentes, sempre acompanhando o namorado da vez e jurando ter professado aquela religião desde que se entende por gente. Caso eu tenha a ousadia de insinuar que já vi esse filme antes, recebo uma descompostura daquelas. Vale salientar que ela já foi atéia mais de uma vez, mas não tive coragem de lembrar estes pequenos detalhes.

Pergunto como vai o trabalho e ela me informa que está de licença médica, pois necessita ficar mais tempo dedicada à religião. Eu tive vontade de perguntar se a cama seria o altar onde se celebram os cultos religiosos, mas não tive tamanha coragem. Fiquei com a língua coçando, estive a ponto de indagar se simular doença seria jurar em falso ou mentir, contrariando um dos mandamentos da Lei de Deus. Ela olha para mim com cara de garota apanhada fazendo uma travessura, como se estivesse a me dizer: eu faço qualquer negócio para não ficar sozinha. Pergunto como vão suas outras atividades profissionais e ela me informa que está afastada de tudo, dedicada integralmente à religião.

Após algum tempo de conversa ela quis me convencer a ir todo domingo ao culto na companhia dela e do marido. Eu disse que iria com prazer, ela sorriu com satisfação, então eu disse que tinha apenas uma condição: eu começaria a acompanhá-la a partir do aniversário de primeiro ano de união do casal. Ela pulou da cadeira e saiu a me xingar generosamente com vários adjetivos.

Marcos Antônio da Cunha Fernandes
www.marcosfernandes.org
João Pessoa, janeiro de 2007.
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