Procurando alguma coisa?

Obras de Amigos

Extrato de um Diário, 7 – Maria Alice Fernandes

SEDUÇÃO & SEDUTORES

Brasília, 21/03/94, às 20h35m

Duas noites que não escrevo, sábado e domingo assisti a cinco filmes, me regalei,
fazia um tempão que não me permitia um desses ataques de luxúria…
Mas prometi falar sobre sedução e jogos de sedução, e cumpro a promessa. Pois é,
eis uma coisa que me deixa fascinada, observar como alguns homens e mulheres são
sedutores – e não estou fazendo distinção de idade, educação, classe social (o que quer
que esta expressão signifique) ou padrão de beleza.

Tenho uma amiga que, se examinada com distanciamento e isenção de ânimo, é uma
mulher feia; mas o brilho do seu espírito – que se reflete nos olhos, nos gestos – é tão
grande, e dela exala uma sensualidade tão refinada, que houve época em que enfeitiçou
a maioria dos maridos num círculo de casais jovens, inteligentes, amigos. Aquela é (e
essa qualidade não se perde com o tempo) uma sedutora. Quando resolvia escolher um
dos rapazes para conversar e o incauto apreciava tiradas brilhantes, sobre assuntos os
mais diversos, era tiro-e-queda: em breve tínhamos cenas de ciúmes patrocinadas por
jovens esposas quase sempre bonitas e bem dotadas intelectualmente.

A mim, a feiticeira encantava pela observação de seu jogo de sedução: a maneira de
falar, o tom da voz que aveludava, os gestos das mãos (muito bonitas e expressivas, por
sinal), os movimentos do corpo, quando dançava, o acender do cigarro, o olhar – ora
direto e franco, ora zombeteiro e irônico; tudo muito vivo, muito envolvente.
Envolvente, é isso, achei a palavra-chave!

Entre as mulheres que conheço, e algumas das que mais merecem meu respeito, há
uma sedutora de quase oitenta, e outra muito perto dos setenta anos.
Meu companheiro era um sedutor, não sempre, mas quando lhe convinha, o que é
mais perigoso. Charme, conversa interessante, opinião sobre tudo, e aquela voz grave,
de baixo profundo, linda no falar, maravilha quando cantando, de tirar o fôlego, dom
divino aquela voz! Também me encantava vê-lo e observá-lo a envolver os outros, que
iam se chegando devagarzinho, e quando se davam conta estavam fisgados.
Pompas de Satanás!!

Invejo-os, os sedutores, sem pejo ou disfarce; sou tão desprovida de tais qualidades
que me sinto como o cocô-do-cavalo-do-bandido quando se trata do assunto sedução.
Um homem um dia me disse que às vezes tinha receio de me olhar nos olhos, porque
parecia que eu queria ver-lhe a alma; e não era elogio, não, pobre de mim, o coitado
estava era reclamando do olhar inquisidor!

Nas ocasiões em que houve uma empatia forte entre eu e um sujeito qualquer (nada
de nomes ou cronologia, por favor), ou o sedutor era ele, ou o sentimento entre nós dois
se sedimentou aos poucos, ou então era uma questão de combustão.
Um amigo querido me chamou, outro dia, de centopéia com todos os cem pés
fincados no chão. Não é uma figura engraçada? Imagine, então, o que seria uma
centopéia que resolvesse bancar a sedutora, sem nenhuma vocação para o “metier”…
Hilariante!

                   0 Comentários 94 Views